Início

segunda-feira, 9 de abril de 2018

Vento furioso e brisa suave












por Karla Caetano


Estavam os dois cada um no seu canto do mundo, conforme fosse o seu mundo. 
Na onde as matas estavam preservadas, 
onde a terra estava coberta da relva, 
onde os campos se cobrissem de flores, lá estava ela. 
Suave, roçando de leve os cabelos do milho.

Na onde os desertos de areia, com mais nada além das dunas e dos animais peçonhentos que se escondem dos homens ou espreitam por eles, 
onde a terra estivesse devastada, aberta em feridas chamadas sulcos ou erosões, 
onde os campos não viam uma única árvore por quilômetros, lá estava ele. 
Furioso, varrendo o mundo e trazendo tempestades.

Lá onde houvessem os rios correndo calmos, circundados de cílios verdes, cujas raízes lhes firmavam os leitos,
onde as plantações se sombreiam e onde a micro vida é abundante, lá estava ela.
Trazendo delicadamente o aroma da lavanda ou do alecrim do campo ou do mentrasto.

Lá onde as águas fossem represadas pelo homem e suas hidroelétricas cortando o fluxo dos rios, onde as monoculturas se estendessem a perder de vista, lá estava ele.
Tentando transpassar ruidosamente as barreiras de eucalipto ou sansão do campo, estrategicamente plantados.

Certo dia, perceberam que ambos estavam tristes e embora nunca se encontrassem no mesmo lugar trocaram palavras reverberando e vibrando o ar.
Descobriram um do outro o motivo do desespero.

Ela descobrira que estava cada vez mais condenada a desaparecer, como desapareciam seus lugares de repouso. Tinha receio de sair do abrigo da terra fresca e da sombra das matas e perder os freios e a razão.

Ele estava cada vez mais solitário como também eram todos os lugares que lhe davam passagem, confessou a ela que nem sempre fora assim tempestuoso. Já fora tão manso e sereno que por muitas vezes fora confundido com ela. Agora sem tantos rios para contemplar sugava da terra nua as águas que não via para refrescar-se, ressecava as plantações e derrubava as roças ao chão. Corria desesperado em busca de um lugar onde pudesse novamente sossegar.

Naquele momento, se pudessem, se abraçariam.
Mas é certo que antes de reconhece-la ele a destruiria. Se a encontrasse primeiro.
É que por onde ele corre, as massas de ar são quentes, e ocorreria uma temida frente, provocando aumento da temperatura.
Se do contrário, ela o avistasse antes, por planar em massas de ar mais frios, ela sem querer empurraria a massa de ar quente, provocando nevoeiro, chuva e queda de temperatura.

A pensar em como andam as coisas ultimamente não seria surpresa descobrir que desde aquela conversa, apesar de tudo, eles venham repetidas vezes tentando, na busca de consolar um ao outro, se encontrar.



Nenhum comentário:

Postar um comentário